passear Coimbra

Domingos de manhã passeados com vagar, fotografias, impressões e confidências feitas à cidade de Coimbra, suas casas e seus casos, seu rosto vivo, suas lágrimas e sorrisos.

Acerca de mim

03 maio 2013


Convido todos a uma visita à minha nova página web
cujo acesso pode fazer-se clicando no endereço seguinte: 

mil imagens, mil ideias e...obrigado pela visita!...

Estimados visitantes:
por causa de complicações, de que peço desculpa,  desapareceram muitas fotografias aqui do blogue
que tentarei repor à medida das minhas possibilidades. Algumas se calhar é que não sei onde estarão a estas horas...

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08 novembro 2008

ÌNDICE DE TODAS AS COLABORAÇÕES PUBLICADAS NESTE SÍTIO

Para visitar cada tema isoladamente, é só clicar no respectivo título.
Para uma visita completa pode ir-se navegando pelos comentários ordenados um após outro.



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07 novembro 2008

Recepções ao caloiros, praxes académicas; uma exposição de fotografias do meu amigo Joaquim Santos

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 Caros Senhores visitantes,



As ferramentas estatísticas destes últimos dias têm-me revelado (pelas péssimas razões que muito lamento) um caudal inusitado de visitantes, ansioso por "dar uma vista de olhos" ao "pitoresco" universo das praxes "académicas", nem por isso tão confidencial que não seja bem conhecido por milhares e milhares dos "melhores" portugueses.

Agradeço a todos a preferência com que têm sido escolhidas algumas das mais "shocking" captações do meu amigo Joaquim Santos, que só a ele pertence a glória de tais documentos, por ter tido fígados e dureza de coração para conviver com tais desplantes e tão deprimente falta de higiene (o que é que será que aquela miúda está a injectar pela boca abaixo?!...)

Já agora, aumento um pouco o tamanho da letra das minhas crónicas que publiquei em dois artigos de 2002 "nada meigos" a respeito da grande e sempre "irreverente" vetusta academia (que eu sei bem que leram, mas fizeram de conta...).


Quanto às praxes (e a outras desgraças) estamos num lugar e num tempo em que os abismos parecem dizer-nos, bem contra a vontade da imensa maioria e regalo de uns poucos "iluminados", que não é esta ainda a última paragem do comboio fantasma que tanto medo mete e que há tantos e tantos anos rola, em gritos e solavancos, escuridão adentro...




falta foto, desculpas


.Estando patente ao público de 21 de Novembro de 2008 a 09 de Janeiro de 2009, inaugurou-se no restaurante "O Porquinho" em Coimbra, uma exposição de fotografias do meu amigo Joaquim Santos.

No documento de apresentação da exposição pode ler-se um pequeno texto de minha autoria, o qual reza assim:
Joaquim Santos é um artista fotógrafo que associa às suas qualidades de interpretação visual a rapidez de reflexos dum verdadeiro “repórter” e documentarista que nunca nos deixa indiferentes perante a enorme variedade de temas que tem abordado ao longo da sua já repleta carreira.
Se acrescentarmos a essas valências a sua enorme familiaridade com as ferramentas de tratamento e divulgação de imagens que a actualidade tecnológica nos oferece, ficamos com a ideia que vale sempre a pena contemplar aquilo que nos dá a ver, seja qual for o motivo em apreço.
Não me é possível abordar aqui com o devido detalhe tudo o que me tem ocorrido ao longo dos tempos a respeito do fenómeno das "praxes académicas".
Certo é que qualquer fenómeno do mesmo tipo tem de ser encarado de acordo com o contexto em que se produz, ou seja, atendendo ao “caldo de culturas” que é denominador comum dos interessados/participantes respectivos. Se esse contexto for dominado por um vibrante sentimento agregador e determinado por um delicado equilíbrio entre o que é o sentido da festa e a dignidade livre dos participantes, tudo bem.
Aquilo que Joaquim Santos nos traz aqui é uma viagem através do fenómeno em causa que transcende o que vulgarmente aparece em milhões de “retratos” ad hoc espalhados pelos escaparates dos industriais do ramo.
As suas fotografias não carecem por isso mesmo, quanto à sua eloquência expressiva, de quaisquer esforços interpretativos. Conforme já disse noutro local a respeito deste seu trabalho “…é um testemunho penetrante e cheio de verdade sobre uma muito maior extensão dessa, apesar de tudo, mal conhecida realidade”.
Costa Brites/19 de Novembro de 2008
O conteúdo mais alargado do trabalho fotográfico de Joaquim Santos é visitável no seguinte endereço: Joaquim Santos-fotografia


falta foto, desculpas


Para que não restem dúvidas nem equívocos relativamente à minha visão das "praxes académicas", fenómeno teimosamente persistente nos "rituais de integração" das universidades (e não só...) abaixo se inserem dois extractos de coisas escritas por mim no Diário de Coimbra, em 2002:



“…A praxe, o que quer que seja

Passando há dias por um pátio universitário, alargava-se em círculo um grupo de jovens mulheres, ou meninas estudantes, conforme preferirem. Tudo seria normal se no meio delas, por terra, não se acocorasse meio estendida no chão uma outra estudante, eventualmente manchada pela "vil" condição de "caloira".
Celebrava-se daquele estranho modo, mais um, para mim incompreensível "ritual de humilhação", peça integrante dessa confusa e fragmentária mitologia a qual chamam "praxe".
Tolerância, paciência e a "dificuldade" sentida (ou vergonha, ou receio, ou... medo?) de rejeitar a desconfortável situação em que se encontra marcam a atitude da jovem que sentirá, por certo, grande alívio quando "tudo aquilo" tiver terminado.
A praxe poderia servir até como prática iniciática ao funcionamento imprevisível e contraditório da Escola – metáfora do país – naquilo que têm de menos bom, mas receio bem que nessa condescendência forçada estejam amassadas a submissão moral e a indiferença cívica que alimentam o "deixa andar" e o "quero lá saber".
Queria trazer-vos, por isso, alguns recados simples:
Apreciai o melhor possível a liberdade fugaz que a juventude vos oferece sem deixar escapar esse perfume raro que se esgota, para tantos, à entrada da idade adulta, mas sem deixar de pensar e valorizar o dia com aquisições seguras, com uma genuína vontade de aprender algo daquilo que pode não vir nos livros.

Direi, a cada um de vós para terminar por esta vez, aquilo que me apeteceu dizer à menina acocorada no chão, naquele dia de outono universitário:
–Levanta-te e caminha! Ninguém te obriga a rituais de humilhação, que camaradagem nenhuma vale, nem amigo nenhum merece!..."

“…Com festas e bolos…

Quanto ao sentido hipnótico dos festejos das queimas de fitas (das tradições…) que se afirmam cada vez mais industrializados, orquestrados como bons negócios, é bom que penseis:
Não estará a vossa Escola a tornar-se um pretexto para aproveitamentos medíocres e duvidosos, no seio de uma sociedade sonolenta, de instituições cúmplices que não cuidam, nem vêem nem avaliam, e de famílias perdidas em serões televisivos de grande audiência e no "tenho muito que fazer" e no "não quero saber das coisas dos estudantes para nada"?
Não estará a Academia e a Cidade e a Escola deixando que se instale uma enorme máquina que progressivamente toma conta, se assenhoreia e explora uma juventude entregue a si mesma, sem ter noção para onde navega, tolerantemente submissa e encantadamente alienada?
Não seria tempo, passados todos estes anos de democracia, que a Festa fosse mais essencialmente dos alunos estudantes, mais chegada a valores positivos, à cultura, ao encantamento juvenil e à beleza da idade, e não tanto um negócio de moda, de alcoóis à bruta, de mau gosto à descrição, de gente alheia a tudo que deveria ser a memória dos valores que valem, porque não se resolvem e esclarecem no oportunismo do barulho e dos patrocínios?...”



Publicado no Diário de Coimbra em 7 de Novembro de 2002
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06 novembro 2008

Museu do Vinho da Bairrada, em Anadia, visita temática e exposições temporárias, a não perder

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prospecto do Museu do Vinho da Bairrada
falta foto, desculpas
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Se o leitor se interessa por motivos de natureza cultural e não está a pensar deslocar-se em breve a Anadia, acho melhor que mude imediatamente de ideias.
O tão conhecido consumismo faz as pessoas viajar muitos quilómetros (se preciso for, de avião) não levando em conta coisas aqui tão perto e de tão grande valor.
O Museu do Vinho da Bairrada é um centro cultural de elevado nível, dotado de arquitectura notável, espaços e infra-estruturas muitíssimo respeitáveis alojando, para além das visitas temáticas permanentes que propõe em conceito de modernidade e avanço tecnológico, um programa sustentado de valiosos acontecimentos temporários.
Estas linhas fazem parte de uma notícia sobre artes plásticas publicada no Diário de Coimbra e no meu blog dedicado a esses assuntos, conversas de pintor, e merecem figurar aqui em atenção ao elevadíssimo número de visitantes que tem este blog por todo o mundo de língua portuguesa e ao importante centro cultural da cidade de Anadia, evidentemente.

05 novembro 2008

Loiça de Coimbra





O tema aqui anunciado encontra-se a partir de agora tratado na minha página pessoal:


(é favor clicar)

04 novembro 2008

Loiça do Juncal, loiça de Sacavém, outras lembranças de pessoas e lugares;

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O tema aqui anunciado encontra-se a partir de agora tratado na minha página pessoal:


(é favor clicar)

15 julho 2008

TÚLIA SALDANHA; Curriculum Vitae resumido

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falta foto, desculpas



O seguinte “curriculum vitae” (resumido) da artista Túlia Saldanha foi inserido num breve catálogo, cuja capa acima se reproduz, de uma sua exposição realizada por iniciativa dos Serviços Culturais da Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros, de 24 a 30 de Junho de 1987.


Túlia Saldanha nasceu em Perêdo, Macedo de Cavaleiros em 1930.
Foi sócia do Círculo de Artes Plásticas des­de 1967 e fez parte do Corpo Docente desde 1974.
Algumas exposições colectivas:
1968
Em Coimbra:
− no Museu Machado de Castro;
− no CAPC;
Em Amarante:
− no Centenário de Amadeu de Sousa Cardoso
1971
Em Coimbra:
− “A Floresta”, no CAPC;
No Porto:
− “O Presente”, na Galeria Alvarez;
Em Óbidos:
− na Galeria “Ogiva”
1973
Em Coimbra, no CAPC:
− "Minha Coimbra Deles" e "Aniversário da Arte".
1974
"Projectos Ideais" na Sociedade Nacional de Belas Artes (S.N.B.A.) em Lisboa
1975
"Semana de Arte na Rua” em Coim­bra
1976
"Alternativa Zero" em Belém, Lisboa,
Encontros Internacionais de Arte na Póvoa de Varzim
1977
"Mitologias Locais" na S.N.B.A. emLis boa,
Cooperativa Árvore no Porto,
Encontros Internacionais de Arte nas Caldas da Rai­nha
1980
Participações:
na SACOM 2 Museu Vostell em Malpartida de Cárceres, Espanha,
"Panorama das Galerias" na Galeria de Arte Moder­na em Belém,
"a Caixa" na Galeria Diferença Lisboa
1981
"25 Artistas de Hoje" no Museu de Ar­te Moderna na Universidade de S. Paulo Brasil, "100 Horas a Desenhar" na Galeria do Chiado em Coimbra
1982
Bienal Internacional de Vila Nova de Cerveira
1983
"30 Horas a Desenhar" Instituto Alemão em Lisboa,
"Exposição Nacional de Desenho" na Cooperativa Arvore, no Porto,
"O Papel como Suporte" na S.N.B.A. Lisboa
1984
"Anti-Heróis, Malditos e Marginais" em Lisboa;
"Pipxou" − Inverno 84 − Galeria Diferença Lisboa
1985
Intervenção no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian Lisboa
1986
II Bienal Nacional de Desenho/85 na Cooperativa Árvore, no Porto;
Faculdade de Direito de Coimbra;
“Agitarte” em Aveiro;
Casa Museu Teixeira Lopes em Vila Nova de Gaia;
Faculdade Psicologia Universidade de Coimbra.
1986
Festa para Ernesto de Sousa;
Como elemento do Grupo de Intervenção do CAPC, participação nos Encontros Internacionais de Arte Caldas da Rainha,
em Coimbra, na S.N.B.A.,
no IADE, no Café Brasileira em Lisboa, etc.
Exposições individuais:
1969, 70, 71 CAPC Coimbra
1974 Galeria Dois no Porto
1976 no CAPC
1979 Gal. Diferença Lisboa
1982 no CAPC Coimbra
1985 na Galeria Diferença em Lisboa
1986 Teatro Gil Vicente Coimbra.
1986 Galeria QUADRUM, Lisboa
1987 Desenho e Pintura Macedo de Cavaleiros
1987 Galeria Almada Negreiros, (aquisições Recentes) S.E.C.
1987 Abertura do Museu de Arte Moderna (Casa de Serralves), no Porto.




falta foto, desculpas


Esta imagem representa as capas de duas edições do CAPC que me foram oferecidas pessoalmente por Túlia Saldanha e que guardo como importantes documentos da actividade daquela instituição, respectivamente, durante os anos de 1979 a 1980 e de 1981 a 1983.



15 março 2008

Os painéis de João Abel Manta em Coimbra (continuação)

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Fotografar o painel de João Abel Manta que se encontra no jardim (???...) da Associação Académica de Coimbra, no seu conjunto, é uma tarefa difícil.
As luzes, as sombras, a desarrumação geral à sua frente, o "horizonte" deprimente, produzem um resultado sempre problemático.
Já tentei mais do que uma vez, mas terei de regressar ao local e tirar proveito de condições de luz natural um pouco mais propícias. Tratar do jardim e organizar a paisagem... está para além das minhas posses...
O que junto abaixo é apenas para dar uma ideia:


falta foto, desculpas


.Ainda ontem um amigo meu referia as empolgantes recordações que tem deste espaço e das enormes e vividas assembleias de estudantes (cidadãos!...) que ali tiveram lugar em 1962.
Que é feito de toda essa gente?

No primeiro sector do lado esquerdo os labores do cinema, seguidos dos operadores da rádio:


falta foto, desculpas
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a seguir, o canto e os seus intérpretes:
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falta foto, desculpas


. depois, a leitura e as danças:
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falta foto, desculpas
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meio escondido pela vegetação supérflua (como tantas vezes no domínio da "realidade cultural"), o teatro:
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falta foto, desculpas


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A obra no seu todo está referenciada, por exemplo, no catálogo que foi feito por ocasião da grande exposição da obra gráfica de João Abel Manta, em 1992, em Lisboa, no Museu Rafael Bordalo Pinheiro.
Na página 318 lá está: "...painel de azulejos decorativos para a "Associação Académica de Coimbra", e o tema designado para o mesmo é: "Actividades Culturais Estudantis".
A seguir, nas páginas 320 a 323 encontram-se reproduzidas as composições gráficas e as montagens quer deste painel do "jardim" quer daqueles que se encontram na parte exterior da mesma AAC, visíveis da Avenida Sá da Bandeira.

Logo que me for possível procurarei complementar e desenvolver o material aqui apresentado, acrescentando algumas considerações mais detalhadas.
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02 março 2008

"Auprès de ma blonde" uma canção antiga, bonita e um bocadinho erótica (pourquoi pas?) que é nome de "trombinoscópio"

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O “trombinoscópio” é uma invenção (entre muitas outras) de um engraçadíssimo conjunto de músicos-actores-animadores, que esteve presente na baixa de Coimbra, no Largo de Sansão (nome antigo e muito mais engraçado que um histórico “8 de Maio”), no dia de hoje, 1 de Março de 2008, no contexto das iniciativas da Semana Cultural da Universidade de Coimbra.

Os artistas são: Thierry Daudé (Trompete), Alfred Spirli (Percussão), Daniel Malavergne (Tuba), e Philippe Neveu (Oboé Languedócio).

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Tirei muitas fotografias dos rapazes, que improvisam música ao mesmo tempo que aproveitam um talento particularmente desenvolvido para interagir com todo o público ali presente.

Hoje não posso pô-las todas aqui, porque já é tarde, mas um dias destes, quem sabe...

A manhã terminou feliz para nós, com um simpático almoço no “Salão Brasil”, onde além da refeição, também fomos “servidos” com música gravada de Rão Kyao (o seu formosíssimo “Porto Interior”, que tem assim ares de China e Portugal casados em harmonia doce !...).

O Salão Brasil, a entrada lá para cima é ali ao lado direito:


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01 março 2008

Os painéis de João Abel Manta em Coimbra, um tesouro muito mal estimado!...

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Muita gente que usa (e usou...) capa e batina, passará ao longo deste trecho da Avenida Sá da Bandeira, à frente do Teatro Académico de Gil Vicente e do complexo de
instalações da Associação Académica de Coimbra, não tendo reparado atentamente nos painéis de João Abel Manta, de 1958, que ali se encontram aplicados.

É possível, e é de lamentar que uma tal coisa possa acontecer, até porque os sete painéis do grande artista (merecedor de destaque no elenco dos maiores da História da Arte em Portugal, e não apenas do seu século) é uma obra dedicada "à evolução do traje académico"!...

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agora de inverno é possível avistar o painel daqui, com a simpática nota musical dos repuxos saltitantes. Assim que chegar a primavera (Deus a traga!...) adeus oh painel...



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Quem se debruce de forma cuidada sobre o actual estado de toda aquela frente do edifício, reparando no estado de manutenção do edifício e na sua apresentação estética, ficará triste, por certo.
Tudo muito descuidado (para dizer pouco...) sofrendo a obra aqui em apreço de um efeito de desprestígio evidente. Digamos que tudo concorre para que "ninguém a veja"!...

É uma vergonha que, não obstante, não fica por aqui: no jardim (???...) da Associação, lá atrás, há um outro notável painel de azulejos, também de autoria de João Abel Manta, sobre o tema "actividades culturais estudantis", votado ao mais desprestigiante abandono!...

Aqui por baixo se reproduzem dois dos que documentam o traje académico nos séculos XVIII, XIX e XX, respeitando as reais proporções dos painéis (aqui tratados para não serem vítimas do erro de perspectiva que afecta o observador que os contemple de perto, ao nível do solo).

O painel aqui apresentado em primeiro lugar, entretanto, encontra-se parcialmente oculto por um indisciplinado "ramalhão". Para o mostrar assim, foi preciso um bom bocado de trabalho com o Photoshop.
Quanto ao desordenado arbusto, não é que eu seja inimigo da natureza, mas se há tanta árvore nobre que é abatida sem piedade, que será que ele ali está a fazer?...


falta foto, desculpas



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falta foto, desculpas

Nestes, como noutros painéis, é observável a sua degradação (azulejos quebrados, além de outras mazelas).
O "recinto" relvado, a vedação com marcos de ferro e correntes (um deles por terra), o estado da parede com grafitos e muita sujidade, as janelas muito mal "lavadas" e com aros ferrugentos (e letras a preto e branco lá por detrás que ali estão a fazer nada, além de lixo visual...), em suma, está tudo para ali a "ajudar o pai, que é pobre"!...

A configuração dos painéis é feita da forma sempre muito engenhosamente estética que João Abel Manta imprime a todas as suas criações, portadoras, além do mais, duma riquíssima gama de alusões de ordem cultural.
O desenho é elegantíssimo e de uma limpidez expressiva inigualável, fazendo concorrer neste caso 3 elementos caracterizadores:
  • à direita, um par de estudantes envergando o traje académico, apenas com ligeiras variantes;
  • à esquerda, um casal de cidadãos comuns (em Coimbra pouco elogiosamente designados, antanho, como "futricas");
  • em fundo, um detalhe arquitectónico de uma obra monumental que pode contextualizar a paisagem artística da cidade, de forma aproximada, relativamente ao período estudantil respectivo.
O desenho hierarquiza os diversos elementos figurados através das diferenças de espessura dos traços e da sua coloração, o que também assinala a diferença dos planos em que se situam.
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E aqui, para que conste, com ferro velho e silvas à mistura (ou coisa que o valha) um aspecto colhido em dia de chuva (melhor assim porque não se vê a miséria toda) o tal "painel das traseiras":




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Comentários poderá toda a gente fazê-los, mas em vão.
Uma vergonha destas, não há comentários que lhe valham!...

O tratamento desta questão deveria ser parte de uma apreciação especializada e profissional (que não cabe aqui fazer-se) de todo o complexo do TAGV e da AAC, conjunto monumental muito significativo do património recente da cidade de Coimbra, todo ele precioso para a sua actualidade cultural, instalações e serviços activos que conviria manter no mais elevado grau de aprumo funcional, técnico e estético.
O Teatro Académico de Gil Vicente é uma entidade pública sob a administração da Universidade de Coimbra.
A Associação Académica de Coimbra e todos os seus organismos autónomos são entidades do mais elevado interesse para estudantes e não estudantes e devem merecer a maior atenção de todos nós, cidadãos de Coimbra e de fora dela.

Se servem a cultura como têm servido e se pertencem à memória de enriquecimentos culturais de tanta gente que os tem frequentado, é bom que continuem a poder fazê-lo.
Se servem a cultura, servem-se do apoio de todos nós, alunos que fomos e pais de outros alunos ou simples cidadãos contribuintes que olhamos as coisas com o direito legítimo de ver o que está bem e o que está mal.
O aspecto exterior que evidenciam estas casas, estes espaços e o seu adorno artístico não é indício de grande cuidado, nem do melhor nível de atenção.
“O que está bem, bonito parece”, é uma observação simples, com a vulnerabilidade natural de tudo o que diz o povo, mas nem por isso verdade menos respeitável.

O que é que funciona mal, ou o que é que não funciona ali?

Numa data posterior, continuarei a observar, com mais detalhe, os simples aspectos exteriores da degradação e do descuido que são evidentes.
Dentro, ao âmago das questões, porventura mais candentes, não me compete chegar.
Cada um que assuma as suas devidas responsabilidades.



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Se falo de passear Coimbra num fim de tarde, é nisto que estou a pensar:

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falta foto, desculpas

numa tarde de luz tão ternamente atlântica


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uma multidão de gaivotas descansa sobre o artificial Mondego



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caminhar é preciso!...



E já agora, a respeito da baixa de Coimbra:
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A única coisa que a baixa de Coimbra não precisa é de que venha acrescentar-me ao número daqueles que tão lamentosamente debatem a sua decadência.
Só me ocorre dizer que, para além de todos os problemas que são ventilados por muitas outras pessoas muito melhor do que eu, a baixa também é uma questão de opção e de cidadania.
Se quiser ir à baixa, vou.
Se a oferta de serviços, se os locais de convivência e de cultura, se os estabelecimentos com rosto humano me convierem, porque não na baixa?
E é isso que faço, em dia de Sábado à tarde, a pé e levando comigo (além da melhor companhia…) aquele vagar que também inclui olhos para ver as coisas como se fosse pela primeira vez.

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O sagrado, o profano e ganha um doce quem souber onde se situam estas coisas:

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Com um grande abraço a todos os meus simpáticos visitantes que tantos recados me têm mandado para que volte a publicar aqui os meus passeios por Coimbra, desejo informar que sim, que estamos de regresso (os passeios, as palavras e as respectivas imagens)

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Das varandas cá de casa também posso passear Coimbra (e assustar-me com ela...)

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12 agosto 2007

A paisagem de hoje, é dentro: não tem horizontes que seja preciso tratar pelo nome

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Existe uma guerra surda entre as palavras e o mundo da comunicação.
As palavras estão cercadas por todos os lados; defendem-se como podem das avalanches da vulgaridade, dos anúncios, da trôpega linguística do poder feito espectáculo.
A barbaridade mediática esmaga todo o significado de certas palavras que deviam ter direito de refúgio em áreas de pudor literário, no esplendor do teatro, na sacrossanta ilusão da poesia. .

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Se falo de paisagem corro o risco de vos lançar em rosto qualquer coisa da futilidade turística, do analfabetismo autárquico, da empáfia dos arquitectos palavrosos.
Quase todo o tempo é gasto a contemplar o mundo por fora, as suas notoriedades, a sua tantas vezes ilusória magnificência.
Saio de manhã a caminhar através da manhã delicadamente fresca de um Agosto de cinza e luzes quasi-outonais.
E as paisagens que visito são iguais à ternura do desapego, à saudade das coisas eternas, à distância magoada da tristeza.
A paisagem de hoje, é dentro: não tem horizontes que seja preciso tratar pelo nome.
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falta foto, desculpas
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Olho simplesmente as ervas que passeiam por mim à beira dos caminhos; todo o ser é igual à sua transcendente e ignota humildade.
Mortos seremos todos como flores secas; e vivos somos um tanto ou quanto iguais nelas em tudo, excepto na ferocidade e no desejo.
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Debruço-me entre o vago suor da fresca manhã estival e a pequena brisa que me traz notícias do país de Outubro: olho de mais perto a preciosidade de uma flor silvestre entre muitas outras. O meu coração bate, não sei quantas vezes, e nenhuma pena tenho de me ir assim, entretanto, aproximando da morte.
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falta foto, desculpas
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Os canaviais são outra faceta das paisagens anónimas de antes e de nunca.

As reminiscentes hortas semi-abandonadas; os poços de tijolo a esmo sem reboco, povoados de musgo e de insectos indecifráveis com milhões de anos; poço aqui tão esplêndidamente inútil que dentro dele ganhou presença viva uma árvore que fica assim parecida a tantas obras de arte de que não fala o tempo, servindo apenas para que nelas poise um olhar breve e casual
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falta foto, desculpas
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um muro tão solitário que jamais serviu para que neles se encostasse, tremente, a ilusão de namorados.
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Fecho a caminhada passando por algumas flores mais intensamente coloridas.

Entre elas as sardinheiras, cuja cor e presença não desistem nunca, fazem-me lembrar o meu querido avô, por ser a flor que preferia.
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As sardinheiras, flores que olho pensando na limpidez dos corações generosos: sempre de pé no seu posto, prontos para dar tudo, seja qual for o tempo e a estação.

11 agosto 2007

Agosto em Coimbra, o melhor mês!...

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E quem disser o contrário, mente!...

And now, for something completely different...


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Sempre que saio de casa a pé, a descer, direito à opulenta civilização da "nova baixa", da centralidade do "mais belo shopping center do MUNDO" (nós os portugueses, é assim: no tempo de D. Manuel I ficámos célebres por uma arrasadora embaixada ao Papa, no terceiro milénio é por termos “aquilo” cá em Coimbra),
sou forçado pelas circunstâncias a passar por este outro notável vestígio da “nossa civilização”.
Não quero deitar abaixo as simpáticas empresas municipais.
Antigamente havia “serviços”, agora há “empresas”.
As únicas diferenças é que:
antigamente ficavam mais ou menos caras e eram dirigidas por um amanuense qualquer;
agora ficam pelos olhos da cara e têm ADMINISTRADORES!...
Percebem a diferença?
Só sei que passo vezes sem conta por aquele esterco todo espalhado ali na descampada terra de ninguém perto da nossa mini-Manhattan (ou será mini-Djakarta?...) da Avenida Elísio de Moura, e fico triste.
Um homem, não é de pau, e a paciência também tem os seus limites, que diabo!... Há já muito tempo a passar por ali e o entorneiro de lixo é sempre assim, um pouco mais ou menos.

Não é que seja má a empresa ou que nos cobre muito todos os meses por aquilo dos resíduos sólidos (nunca repararam naquela verbazinha nos vossos recibos da AC, Águas de Coimbra, EM?). É que, além de termos de presidir à sua fundação como contribuintes, também temos de dar qualquer coisinha todos os meses para a ajuda da recolha do lixo, é claro.

E a respeito do comportamento dos cidadãos que assim tão desconsideradamente tratam a comunidade, não se diz nada?
Claro que se diz, e diz-se que é lamentável.
Serão gentios, trogloditas, bárbaros?
Não, são pessoas como quaisquer outras. Como “nós”?
Se calhar, sim. Mas talvez não tenham por si mesmos aquele mínimo respeito que deveriam ter.
Talvez não tenham percebido ainda que todos nós merecemos − como eles próprios − um ambiente asseado, livre dos seus próprios detritos.

Nota de pormenor:
à volta daquela espalhação de lixarada, há cacos de vidro por tudo quanto é sítio.

Há algum tempo inseri neste blog aquele comentário a respeito do “adoro-te MITÉ”.
A arrebatada inscrição estava lá havia muitos meses e, com certeza por meríssimo acaso, foi limpa passados poucos dias.

Espero que um meu simpático e diligente leitor (se é que existe), funcionário (quem sabe Administrador) de alguma EM esteja tão atento às declarações de amor sem freio como aos lixos espalhados pelo chão…

Quanto aos cidadãos autores da porcaria, teremos nós de esperar mais um século para que se auto eduquem?
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17 junho 2007

Passeio na Serra da Lousã, almoço no Talasnal

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Fomos hoje passear à Serra, andámos por estradas incríveis e o que nos valeu foi a maravilhosa chuva que criou aquelas cortinas imensas que nos permitem deixar de ver os pequenos e vulgares acidentes da paisagem, e passam a deixar-nos entender toda a incomensurável natureza das coisas.

falta foto, desculpas
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As serras, as verdadeiras serras, são todas da minha infância.
Saturadas de aromas e de mistérios não cabiam nos mapas, não tinham fim nem princípio.
A minha terra estava cercada de serras por todos os lados, por imensos vales ao fundo dos quais havia sempre um rio fresquíssimo que corria ali ao sabor da eternidade.
Uma ponte era como um grande brinquedo medonho, uma caixa construída por grandes vigas de ferro de várias espessuras, com enormes cavilhas arredondadas e pavimentada com alcatrão todo esburacado.
Apoiava-se em enormíssimos pilares de pedra ovalados e quando as barragens foram construídas toda aquela imensidade de ferro pintado de tinta toda velha e encarquilhada começou a ser engolida metro a metro, centímetro por centímetro, pela água que subia implacavelmente.

Havia uma pequena localidade que ia ser engolida, e no mercado, na loja dos Senhor José Matias e à saída da Igreja toda a gente falava no enchimento da barragem como se fosse a mais extraordinária tragédia de todos os tempos.
Lembro-me de ver, um Domingo de manhã, um homem que estava deitado na cama, numa certa casa à beira da estrada, que estava a ser engolida pela água.
Fui lá com o meu avô, que foi levar algum alento e coragem àquele homem velho e desesperado que não queria abandonar a sua antiga e modestíssima casa.
As pernas da cama já estavam bem metidas dentro de água, e todos nós sabíamos que ela não ia parar de subir, porque tínhamos feito um risco no alcatrão e passado uns minutos o próprio risco já tinha sido coberto.

Quem jamais poderia esquecer-se de acontecimentos tão espantosos como estes, de lágrimas tão incómodas e de palavras tão desesperadas como as daquele homem vendo o seu mundo sumir-se debaixo de um rio que crescia impiedosamente numa plácida e soalheira manhã de Domingo?
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A Serra da Lousã é assim, entre moinhos que não são de Cervantes nem servem o combate de delirantes Dom Quixotes. Há pequenas aldeias onde vivem estrangeiros, retirantes da Europa central que rejeitaram sua glória e seu método. Fazem-me pena as suas crianças, portugueses de futuro incerto pelo isolamento e pela estreiteza de horizontes. Contradições nada condizentes com a altitude e a paisagem....A Serra da Lousã, como todas as outras, tem imensas histórias contáveis dentro da desmedida do seu dorso castanho carregado de mil e muitos verdes, todos diferentes.
Parece-me muito, mas muito mais pequena que as serras da minha infância.
O seu multifacetado carácter de serra de muitos episódios e acontecimentos, é reforçado pela variedade da sua flora, pela variedade de paisagens que dentro dela se desdobram em cenários tão diferenciados.
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Para mim é, por assim dizer, uma serra feminina.
As serras da minha meninice eram imensas e viris, cobertas de verde escuro, cheiravam imenso a resina e a flores silvestres.
A única coisa que lá havia, além do Rio Zêzere e da Serra da Santa onde o povo fazia promessas, era a imensidade de vales profundos, a modéstia inquietante de casas escondidas por vales soturnos, homens de mãos grossas e mulheres baças de olhar triste à espera do vapor que os levasse para além do mar, para as terras da promissão.
E calor ofegante no verão e nuvens cinzentas muito escuras carregadas de chuva, no Inverno.

De ralis, moinhos de fazer electricidade, antenas disto e daquilo, parapentes, rapazes desvairados cavalgando motas, nada de nada!...
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A torrente de águas cantantes, os fetos, as flores, a variedade amável dos verdes aqui estão que não me deixam mentir...
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Havia uns amigos meus que tinham casas no Talasnal.
Eu sempre gostei duma pequena brincadeira ingénua dizendo que são autênticas privilegiadas as pessoas que habitam no “telejornal”…
Quando faço esse simples jogo de sonoridades a solicitude das pessoas é enorme:
− Olhe que não é telejornal, é TALASNAL!...
Viver no telejornal, aliás, é mal que não se deseja nem ao vivo inimigo!...

A chuva, a minha sempre desejada amiga, afasta muitos visitantes, deixa as coisas mais iguais a si próprias, mais lavado o ar, mais apetecível o respirar fundo, sem pólenes nem poeiras que no ar seco abundam.

No telejornal, perdão, no Talasnal, espera-nos um conhecido restaurante impensável nas serranias do Zêzere de antanho. Come-se bem e pode-se conversar. Como estamos sozinhos fazem o favor de desligar a música.

 

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Restaurante Ti Lena, no Talasnal; de Lisete e Amélia Dias; Tel.: 93 383 26 24; 91 704 56 08
(anúncio completamente grátis, em prol da interioridade da Serra/Mãe, posto aqui por nos ter sabido bem o almoço)

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A cultura do barulho

A música, o barulho, uma coisa que se insinua por tudo o que é buraco em todo este país, num pavoroso ódio ao maravilhoso silêncio.
Prospectos de luxo anunciando qualidade de vida, natureza e belas paisagens.
E por aqui e por acolá, motas rugindo, jipões roncando, alto-falandes produzindo “música”, ou pseudo-música, em ritmos frenéticos sem cor nem gosto;
Barulho, é o que é.
Onde menos se espera…

Abaixo a cultura do barulho, viva a boa música ou − na melhor das hipóteses − a subtil respiração da floresta, irmã do silêncio − que é de oiro!...


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Ora aqui temos uma aldeia de xisto completamente diferente de uma imensa quantidade delas que pelo interior serrano nos mostram a angústia dos seus telhados afundados, as janelas e portas escaqueiradas pela ventania da desertificação. Um luxo onde vivem senhores doutores de Coimbra que compraram no bom tempo e que restauraram amorosamente o seu refúgio - cofre de silêncio metafísico...
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O Candal, regalo e paragem de retratistas. Por debaixo da ponte corre outra torrente de água fresca. Bendito Junho!...
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12 junho 2007

Algures, para os lados do Calhabé

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Coimbra também tem os seus Jacarandás

(vai com letra maiúscula porque me parecem merecer as árvores nome de gente: substantivo próprio!...)


.falta foto, desculpas

.O estádio de Coimbra começou por ser simpático a algumas pessoas que por ali passavam de autocarro. Como o viam de relance, em passagens breves, chamavam-lhe até “o disco voador”. As suas formas ovaladas, de cinzento alumínico, sugeriam esse mito cinematográfico de contornos evanescentes.
Hoje tornou-se naquilo em que se tornam todas as outras coisas: suporte publicitário, escaparate de anúncios, plataforma para os infatigáveis esforços do marketing!...
Os monumentos do passado oferecem-nos as suas pedras impregnadas pela usura do tempo. A esse metal nobre chamam os versados em arte histórica: a “patine”.
Enobrece mais que o cabelo branco e que o oiro reluzente.
Alguns falsários especializam-se em fabricá-la.
Mas só o tempo, “esse grande escultor”, pode genuinamente acrescentá-la aos objectos que resistem ao passar dos séculos.
E o “disco voador”? Que será feito do “disco voador” daqui a um solitário século; daqui a um insignificante centenar de anos?...
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Uma estátua levanta-se diante de mim.
Como sempre a vi mais ou menos de longe, sempre me pareceu figurante de um romance alheio, personagem ensimesmada simulando a marcha para o destino incerto.
Visto assim de perto, o bronze de que é feito adquire um peso, uma soturna gravidade que me mete medo.
O pretinho que vai lá em cima, às cavalitas do soldado, fica quase invisível por efeito do maciço soco de pedra. A espingarda, não!...
A espingarda, vista por quem passa no chão é a verdadeira e principal protagonista da escultura. Não está apontada para nós, mas sentimos que pode disparar a qualquer instante, produzindo um estampido medonho.

Não é por isso, contudo, que aqui está a foto. É a inscrição (apaixonada…) que me inspira.
No soco de pedra uma frase:
ADORO-TE MITÉ
(assim de chofre, sem ponto de exclamação nem reticências).

A minha categoria de cidadão completamente desprovido de defesas perante a irredutibilidade dos afectos, cai de joelhos perante a evidência universal dos impulsos românticos.
Ignoro por inteiro que género de intenção possa ter estado na origem de tão enorme grito de alma.
Conspurcar um monumento é um crime punido pelo artigo xis do Decreto Lei ypsilon do ano tantos do tal, dirão alguns. Cem por cento de acordo, tudo bem!...
Mas a vontade, a irreprimível vontade de exprimir um desejo assim, tão rente às águas como um grito desesperado do homem que se afoga, tão desesperado como o pedido de socorro de alguém envolvido pelas chamas de um incêndio: um grito de desejo assim
ESTAVA LÁ ANTES, há milhares de anos, IMPRESSO NA ALMA DE QUEM GRITA!...

ADORO-TE MITÉ!...

Não sei se me envergonhe de dizê-lo, se me empolgue ao confessar-vos:
De cada vez que ali passo e leio a frase, aperta-me a garganta um indizível sentimento de comoção.

Esse desejo originário, sei lá, de que irrisório impulso de transgressão, arrasta consigo – não obstante – a representação simbólica dum possível drama de contornos indefiníveis.
Pode ser um grito de violência atávica. Mas pode ser da mesma forma um apelo da mais pura e cristalina afeição; lágrima solitária e diamantina dum arrebatado coração trespassado.
Vá lá saber-se como e quando?!...
Vá lá saber-se porquê?!...

Ao singelo autor da inscrição dedico, em lágrimas comovidas, “o soneto da fidelidade” de Vinicius de Morais:


De tudo, meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive) :
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.


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11 junho 2007

As fotografias que não tirei ficam como lamento de mim próprio, cidadão incauto de um mundo aflito

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Passo pelas grades de um jardim de infância.
Sou atraído pelo galrear alegre das crianças, pelo irresistível apelo da sua pureza de alegria e juventude.
Puxo da minha máquina/bloco de apontamento e tiro duas fotos.
Ai de mim!.... Oh infeliz, oh réprobo, oh mal aventurado!...
Sou rodeado instantaneamente por um grupo de vigilantas, cheias de zelo proibitivo e de argumentos esmagadores.
- Está bem, desculpem, está bem, eu prometo que não torno!...
Apaguei as fotos (duas fotos!...) ali logo na presença enérgica da única vigilanta que sobrou para dialogar (desconfiada e azedamente) comigo.

Se eu fosse criminoso preparando um roubo de crianças, teria fotografado de longe, à socapa, com uma lente de longo alcance. E se quisesse mesmo roubar, para que diabo ia fotografar antes???...
Se eu fosse fotógrafo profissional namorado da prima do vizinho de não sei quem, ia lá dentro e podia fotografar os meninos todos, com nome e morada, e os papás até me pagavam.
Não sei se isso me daria direito a aprisionar o corpo (ou a alma..) deste ou daquele menino.
Entre fotografar um bando de crianças vestidas todas de igual, anónimas no vozear cristalino da sua alegria colectiva, e roubar uma delas, levá-la para longe de avião, sumi-la do doce afago de seus amorosos pais… vai uma certa distância!...
O que ressalta de tudo isto não é o zelo de quatro ou cinco vigilantas, nem o perigo real que a situação envolve.
O que ressalta é a desconfiança radical, a vulnerabilidade das pessoas isoladamente, os estereótipos duma coisa que se não sabe, mas se pressente e é esmagadora.
A raiz do medo em suma, a planta funesta que seria desejável extirpar do coração do mundo, a golpes de ternura e de justiça; a golpes de paz e de amor pelo próximo.

Devoradores de telejornais, aceitamos placidamente todas as reportagens indiscretas (frequentemente obscenas e até imorais) da televisão.
A televisão é o poder.
Está acima de todos os outros “observadores” da realidade.
Pode entrar sem bater à porta, surpreender os pobres na sua vergonha de modéstia, os doentes no seu desconforto doloroso, aqueles que choram os seus mortos para exibir indecorosamente a sua dor e o seu irreparável desgosto.

Um rapaz como eu não pode assomar-se a um jardim infantil, comovidamente escondendo a lágrima saudosa de seus netos, sem que as eficazes vigilantas vejam em mim o pedófilo ameaçador, o raptor iníquo, o infamante violador.

Oh pobres almas, Oh triste mundo!...

04 junho 2007

Passear Coimbra foi passar um fim-de-semana a Lisboa

Passear Coimbra foi passar um fim-de-semana a Lisboa.
Significa isto que “a cidade” é, mais do que um conjunto de lugares, um encadeado de vivências e percepções.
Esta e as outras Coimbras (porque há muitas: todas iguais, todas diferentes, como as pessoas que nelas habitam) encontramo-las onde soubermos e onde nos seja possível estar e aprender convivendo.
As cidades são amores difíceis.
Impõem-nos uma disciplina de dedicações múltiplas: um querer sabê-las, um querer vivê-las à medida dos meios de que dispomos.
E tempo que permita construir a memória.
E vozes que se cruzem com a nossa.
Mais do que morarmos nelas é necessário que morem elas em nós e tenhamos o privilégio de conhecer a suas múltiplas faces, as mais hospitaleiras e felizes, ou as mais contraditórias e dramáticas.

Na Cervejaria Trindade pode fotografar-se à vontade. Eles lá sabem porquê! (ver adiante, texto sobre os burocratas anti-imagéticos do Metropolitano de Lisboa)

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Os grandes hipermercados da arte e da cultura, parece estarem cansados.
As políticas orçamentais (Oh, Deus meu, que de fortunas se poupam neste país em cultura e artes − até me espanta que haja deficits!...) fazem com que certas casas outrora repletas de acontecimentos estejam frequentemente inertes ou a meio-gás. Outros locais, por seu turno, prometem bem mais do que aquilo que deveras dão. (Isto é, não quer dizer que se gaste menos; gasta-se é doutra maneira, com outras coisas e com outros "protagonistas", como sabemos, não raro, até muito mais...)

É tempo, portanto, para revisitarmos aquelas coisas que são sempre novas, ou seja: as que fazem parte da cultura perene; lá, onde mergulham as raízes da memória colectiva.

Do terraço do zimbório da Igreja de Santa Engrácia, também oficialmente Panteão Nacional, olhando muito para lá de Santa Apolónia, da Madre de Deus e de Xabregas, descortina-se aquela ponte compridíssima que tem o mesmo nome dum dos homens que mereceu cenotáfio (ou memória de corpo ausente) no mesmo Panteão: Vasco da Gama!...

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Por este tempo, em Lisboa, é quando florescem as coleantes árvores da flor azul.

São mais que bonitas: enfeitiçam a paisagem com o sua cor exótica atrevidamente tropical, que não é tão serena nem tão profunda como o azul do céu; o que não é para admirar porque nada há que possa comparar-se à gloriosa profundidade do céu.

A árvore das flores azuis, que em Lisboa aparece ao mesmo tempo que a Feira do Livro, sabe surpreender como poucas; até o seu nome, inventado pelos Índios da Amazónia, é colorido e apetece dizer: Ja-ca-ran-dá!...
Para dar um aspecto de cultura a isto se dirá que o Jacarandá mimoso, ou Jacaranda mimosaefolia, é da família das Bignoniaceas. Mas mais não digo que me posso enganar.


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Sob a cúpula de Santa Engrácia repousam os restos mortais de figuras mitológicas, ressoando pelo majestoso espaço acordes sempre impressionantes de Mozart e de Beethoven, intervalados aqui e ali pelo timbre sumptuoso do canto de Amália.

Humberto Delgado, Marechal, repousa solitáriamente numa sala, austera como todas.

Amália é a única figura acarinhada com mimos permanentes: flores, mármores passados a pano e orações de íntima veneração.
A grande, a solene Amália, que bem me lembro do seu vulto negro sereníssimo, antes de entrar em palco, repousa na sala dos escritores, onde, nas horas secretas, sempre pode conversar com Garret, Junqueiro e João de Deus.

Na área mais nobre do templo, nos seus braços de cruz grega, ali estão os cenotáfios de Camões, de Nuno Álvares, do fero Albuquerque, do universal Gama e do misterioso Infante patrono das navegações.


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Olhando para poente é o poderoso edifício do Mosteiro de São Vicente de Fora que pode ver-se, e que vamos visitar de seguida.

À direita, o Campo de Santa Clara (vulgo Feira da Ladra), que outrora era espaçoso quando por lá passava e que agora parece que encolheu, como as larguíssimas e acolhedoras ruas onde brincávam os miúdos, feitas agora exclusivamente pistas de aceleração e estacionamento.



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Nos largos corredores de São Vicente de Fora está, desde Junho de 1999, uma surpreendente e magnânima exposição de painéis de azulejos!...

O edifício, já de si, é riquíssimo nessa modalidade de expressão artística, com escadas, corredores, claustros e muitos outros espaços ricamente cobertos por milhares e milhares de quadriláteros vidrados de cerâmica, pintados a azul e branco.

Agora está lá uma espantosa mostra de azulejos recuperados ilustrando as célebres fábulas de La Fontaine.

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Uma ávida curiosidade torna curto todo o tempo que lá possa passar-se de visita.

Algum desânimo ressalta da pouca divulgação e duma certa, digamos, modéstia da realização.
Catálogo, não há. Ou está esgotado, o que dá no mesmo.
Informou-nos um vigilante que “foram os Franceses”!...
Levaram tudo, porque La Fontaine lhes diz muito.

Mas os azulejos são “nossos” e a exposição está para ali, em todo o seu esplendor, faltando-lhe a orgânica e a divulgação de um enorme e, repito, surpreendente acontecimento artístico.

- Para quando a reedição do catálogo?...
- Ah, isso não sabemos!... A culpa é dos franceses: levaram tudo!...


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Este é um de trinta e sete painéis que documentam de forma opulenta as fábulas de La Fontaine. Neste caso: "A águia e a pêga".

Uma frustrante e desmoralizadora visita aos azulejos do Metropolitano

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Domingo de manhã aponto para um objectivo muito apetitoso: uma visita com vagares e olhos bem abertos à estação do Jardim Zoológico, decorada com temática a propósito em azulejos da autoria de Júlio Resende.

É um encantamento.
Todo o espaço, paredes e até o próprio chão, estão recobertos com mil e uma sugestões que nos levam de visita ao esplendor da selva. A calçadinha à portuguesa vem fazer companhia aos azulejos, acrescentando sugestões de passear no verde selvagem, em veredas e figuras que se colam aos nossos passos, convidando-nos a reviver uma desejada infância contornando por aqui, correndo por acolá.

Uma selva perigosa, cheia de susto e de animais ferozes? Não!...

Esta selva tem tudo na cor, no espanto, no canto musical das aves e no seu esvoaçar aberto de penas macias e grandes esperas ao poente.
Uma arca de Noé com flores e todo o género de adereços naturais ali, onde é fácil esquecer que estamos debaixo da terra, passando os comboios de tantos em tantos minutos.

Uma certa distracção provinciana, ou o entusiasmo de pensar que o mundo − nem que seja por instantes − pode deixar de ser aquele sítio chato em que o cidadão se não é tramado assim, é tramado assado, impele-me a olhar livremente, puxando da tal maquineta fotográfica com que faço este “passear Coimbra” e vai disto:
fotografia para aqui, fotografia para acolá, flash quando é preciso, com toda a alegria e sem temor!...

O pior, é o mais mau!
Há dezenas de anos que ando de Metro em Lisboa, nunca vi um daqueles Senhores fardados chamar a atenção de quem passa para os azulejos:
- Meus Senhores, reparem só um instantinho, temos aqui uma obra de arte para mostrar a toda a gente: Vejam só estes azulejos, uma maravilha!...
Nunca, jamais, em tempo algum.

Mas naquele Domingo de manhã lá veio não um, mas dois fulanos (um à paisana, primeiro, outro fardado, depois) dizer-me que não podia tirar fotografias (“…por causa dos direitos de autor!…”)

Direitos de autor? Umas tanas!...
Pelo que lutam estes extremosos “defensores de direitos” é por uma noção redutora e burocrática da cultura. Uma cultura com açaimo, onde os direitos são os de não olhar para as coisas, afirmando uma posse sem horizontes de objectos que se não estimam, nem divulgam, nem amam.

Bem como toda a obra do Metro (que a princípio toda a gente chamava “o centímetro”, porque era pequenino) também ajudei a pagar os painéis. Para não falar nos bilhetes e passes, que já paguei muitos, para poder viajar de Metro, um sítio tão público que é como se estivesse ao ar livre, como nas praças e ruas do meu país!...

Havia, apesar de tudo, uma tonalidade hesitante no recado repressivo dos fulanos que mandaram parar com as fotografias. Estariam com pena das minhas ingénuas fotografias, ou estariam com vergonha de importunar um cidadão em pleno exercicio dum legítimo encantamento?!...

Vá lá saber-se...

Alguém os deve ter mandado.
Alguém que nunca deve ter olhado para os azulejos rachados, manchados, sujos, partidos e descolados que já por ali abundam!...

Defesa dos direitos de autor? De que autor?

Eu sou autor do meu olhar e sou cidadão deste país e não devo nada ao Metro, nem aos Administradores que ganham tanto que nem devem precisar de andar de Metro, mas mandam dar ordens sem pés nem cabeça que estragam uma manhã a quem tenha um minuto de alegria dourada tirando recordações de uma parede em Lisboa, para poder mostrá-la aos amigos em Coimbra.

Direitos de Júlio Resende? Hum, duvido muito!...
O artista, se soubesse o amor com que olhei a obra de sua autoria, ia regalar-se, tenho a certeza.
E as fotos de recordação, ia vendê-las, não querem lá ver?!...

Oh Senhores Administradores, se aqui estivesse a grande poetisa Natália Correia dir-vos-ia:
“…Oh esfomeados do sonho
A Poesia é para comer…”

E eu acrescentaria:
“…Oh burocratas néscios
O que é belo é para toda a gente ver!...”

06 maio 2007

O Tovim, Coimbra, dramas urbanísticos como há muitos...

É favor notar:
  • Este texto foi escrito na sua quase totalidade em 1999, e algumas coisas já estão ultrapassadas, infelizmente, nalguns casos, para pior.
  • A fotografia acima, tirada há uns bons dezasseis anos, mostra os meus dois filhos na parte detrás da casa onde habito, lugar ainda cercado por espaços toscamente revoltos, mas ainda com árvores, e algum espaço para brincar com os amigos...
Tópicos aqui abordados:
  • Uma apreciação geral da paisagem de Coimbra em geral, e do Tovim em particular;
  • Da incapacidade das autoridades municipais, e outras, em usar para benefício de todos o património paisagístico e espacial desta e de outras terras;
  • Dos inúmeros abusos e faltas de sensibilidade, públicos e particulares, que afectam a fortuna e o viver das gentes que aqui habitam;
  • De como uma coisa bonita se pode tornar feia, se a não tratarmos com amor;
  • De como as crianças daqui vivem tristes por não terem onde brincar, e de como os velhos andam cabisbaixos e sós quase pelas mesmas razões.


A PAISAGEM, O LUGAR, OS HORIZONTES

Esta cidade onde vivemos estende-se por sobre um solo muito enrugado, com vertentes acentuadas, entrecortadas por vales estreitos e, se não fora a largueza dos vales abertos pelo rio (Mondego, claro), ficaria reduzida aos horizontes que lhe permitem os pontos mais elevados, no lombo de cada cabeço ou nos pontos extremos das serranias mais levantadas.
Fazer urbanismo e organizar o solo em condições tais seria um privilégio requintado para um arquitecto que pudesse, ou quisesse, tirar partido das mil e uma possibilidades da paisagística tão intensamente requebrada e de mil maneiras modulada.
Um desenvolvimento precipitado e tosco produz um tipo de acumulação de edifícios que continua a proporcionar até certo ponto, para quem olhar de muito longe, um sentimento de enquadramento paisagístico razoável, um sentido de cidade em expansão dinâmica.
O tecido antigo da mancha rural, as suas hortas e pequenos bosques vai escondendo como pode os aleijões mais gravosos do disparate da arquitectura do pato bravo, ave pouco adequada para estigmatizar aqueles que têm sido designados sob esse epíteto, por ser tão livre e por ser tão simpática.

A IGNORÂNCIA, A INSENSIBILIDADE E A IRRESPONSABILIDADE URBANÍSTICA

Com o acentuar dos erros de distribuição urbanística aquilo que de início poderia ser um regalo para os olhos começa a não enganar ninguém, nem de perto nem de longe. Sobretudo nas áreas onde as taxas de ocupação dos solos têm ultrapassado a medida do razoável, a mancha citadina é já uma parede espessa de estruturas de betão armado, que cortam o fôlego de quem as observa, e reduzem ao desconforto o quotidiano de quem nelas habita. Para aqueles que escolheram residir na margem menos saturada da antiga paisagem campestre, e ao fim ao resto para todos os outros habitantes da cidade, o problema torna-se muito mais do que simplesmente estético, e passa a ser uma questão que lida com cada parcela da liberdade do cidadão, com a saúde e o bem estar da sua família, com o tipo de convívio e o relacionamento que mantém com a comunidade e com a própria natureza. O local onde habito, tecnicamente designável como "urbanização", nasceu duma velha quinta à beira da estrada e talvez pudesse ter sido concebido para nele vigorar alguma qualidade de vida, com alegria e entretenimento para os mais jovens e com a necessária serenidade e paz de espírito para os mais crescidos, se o espaço tivesse sido utilizado de forma inteligente e mais generosa. De acordo, aliás, com a tradição bucólica do espaço rural dos Tovins.

O LUGAR ONDE VIVEU VITORINO NEMÉSIO

A estrada em referência adquiriu depois de para aqui vir o nome enobrecido de um grande cultor da língua portuguesa, Vitorino Nemésio, que aqui residiu num local chamado "os casaréus", e que ficaria à vista da janela da minha cozinha. Da habitação do grande artista conversador apenas sobrou uma modesta porta, actualmente encastada no muro duma luxuosa vivenda. Bem pouca coisa para lembrar o mestre, ou francamente menos do que mereceria o seu vulto criador, atendendo à presença assinalável que teve nesta cidade de Coimbra.

VALE DE CANAS - UM PARAÍSO PERDIDO

Quem há três ou quatro dezenas de anos contemplasse de longe este subúrbio, sem se dar conta da pobreza de muitos dos seus moradores, da carência de infra-estruturas, do abandono das quintas e da tortuosa e velha estrada para Vale de Canas, iria mesmo assim deliciar-se com a vista, já para não falar do deslumbramento que era sentido ao chegar lá acima, à jóia da coroa das paisagens de Coimbra, donde se podem ver as sumptuosas serranias para nascente e todo o enorme vale que desce em abertura até lá para as bandas do mar.
Já eram bem diferentes as coisas há dez anos quando para aqui vim, mas foi meu privilégio ter visto crescer o meu filho mais novo num tal espaço, onde ainda pôde construir um imaginário saudável, ligado à fruição duma liberdade relativa, na companhia de alguns vizinhos da mesma idade. Refiro esta fase embora ela não derivasse de nenhuma espécie de acção organizada pelo homem, antes resultasse apenas do anarquia semi-rural do espaço em torno.

A DES-URBANIZAÇÃO ONDE EU MORO, E AS OUTRAS...

No sítio onde moro, a marcha incontida de obras envolventes, arrastadas, permanentes, numa ocupação sistemática de todas as áreas livres, levadas a cabo sem qualquer respeito pelos habitantes já instalados, uma arrogância dos agentes construtores cientes de que são eles quem tudo manda, sem terem de respeitar nenhuma espécie de regulamento ou legalidade. Tal atitude deriva, obviamente, duma conivência da fiscalização municipal, forçando o cidadão contribuinte a sentir na pele uma lista incontável de inconvenientes que oscilam entre a mais simples e ingénua desatenção ao abuso premeditado e negligente, capaz de causar acidentes graves, conforme pude constatar pela minha observação directa, mais do que uma vez, das próprias janelas de minha casa, sem ter necessidade de sair à rua. Por toda a cidade aliás se estende esse tipo de comportamento. Uma empresa construtora que tenha pela frente qualquer espécie de iniciativa goza, ao que parece, de uma espécie de tolerância permissiva. Pode rebentar passeios, estoirar com o pavimento das estradas, espalhar betão nas ruas, deixar a estrada atulhada com as sobras da sua actividade, areia, terra, tábuas, etc. Os cidadãos são continuamente ofendidos com tais abusos que lhes roubam a tranquilidade, o silêncio, o espaço na via pública, o encurtamento ou ocupação de passeios etc. Não raramente se tem instalado neste local um verdadeiro império do pó ou da lama, sem que nada nem ninguém seja chamado à atenção, como se uns cidadãos fossem merecedores de toda a tolerância, e outras vítimas sem protecção de todas as arbitrariedades. Será a capacidade de fazer obra (e ganhar muito dinheiro com isso) um privilégio prepotente, uma virtude mágica sem rei nem roque?
Pergunta pois o munícipe:
– Haverá leis neste país? Haverá regulamentos nesta cidade? Quem vela por nós, cidadãos apeados de poder? Quem defende a lei? Quem nos governa?
Ninguém, aparentemente, é a única resposta que ocorre a quem contemple criticamente o que se passa.

Sob o ponto de vista cívico, o cidadão anulado pela indiferença, desarmado de capacidade crítica, é um capital cómodo e conveniente de suporte político, disponível para caucionar dualidade de critérios, abusos de poder, favores aos amigalhaços, esquecimentos convenientes e tolerâncias amistosas. Isto, a par de outras coisas mais dificilmente enumeráveis, mas que existem.
Seria necessário reforçar a persistência interessada de quem olha as coisas com o sentido de ver e de todos aqueles que guardam na memória episódios realmente concretos e testemunhados por vizinhos, que permitissem denunciar com clareza que a administração da cidade, onde não peca por incompetência, peca por omissão conveniente, e onde não peca por incapacidade técnico-administrativa, peca na defesa de interesses que não são aqueles que dizem respeito aos cidadãos no seu todo, mas apenas a certos e determinados interesses.
O esgotamento da liberdade espacial, a maximização da ocupação dos solos, a pressão duma lógica exclusivamente ligada ao interesse do empreiteiro mestre de obras, tem vindo a reduzir ao mínimo a liberdade do local onde habito.
Embora sendo uma zona onde se vão erigindo também vivendas de alto luxo e de preço elevadíssimo, não pode afirmar-se de jeito nenhum que a área envolvente possa vir a ser no mínimo aprazível. Antes pelo contrário.
As crianças do futuro que aqui nasçam terão de fugir para longe, em busca dum qualquer espaço disponível onde possam construir o seu imaginário e inventar o seu gosto de viver.
Atendendo a que nesta área se acumulam em promiscuidade urbanística velhos casinhotos de gente muito modesta e residências de velhos habitantes do local com festa do Santo, procissão, foguetes e tudo, a par de prédios de andares com milhares de condóminos profundamente desenraizados que timidamente se ignoram uns aos outros e algumas vivendas de luxo de altíssimo custo, a colina – vista de longe – começa a ter o aspecto visualmente insuportável de empastado incaracterístico com irrecuperável mau gosto.
Pior do que isso, oferece todos os inconvenientes duma situação irreversível, de recuperação impossível para o uso moderno e confortável do espaço, afastado ainda por cima de normas de funcionalidade e segurança, gestão de recursos turísticos, paisagísticos, patrimoniais, naturais, etc.
O presente depoimento não é um levantamento sistemático dos erros catastróficos que têm sido cometidos por toda a cidade no assalto precipitado ao solo urbano. Ao ponto em que as coisas chegaram já não é necessário um arquitecto paisagista para fazer esse trabalho, embora seja evidente que um estudo crítico adequado deve ser feito por especialistas que os há disponíveis e competentes para tal.
A Câmara Municipal de Coimbra tem tido durante anos e anos ao seu serviço especialistas nessas matérias e, nem este, nem os mandatos anteriores pode eximir-se às inerentes responsabilidades que, a meu ver, adquirem perfil de atentado patrimonial gravoso, que a história julgará com todo o rigor e consciência de prejuízo.

O sentido da ideia de património está geralmente ligado ao espaço histórico e às zonas monumentais de aglomeração urbana antiga.
Para mim esse conceito é demasiado estreito, porque julgo que todo o espaço da cidade, toda a natureza que a envolve e rodeia, o próprio sentir e a liberdade dos seus cidadãos são elementos patrimoniais essenciais, estruturantes da memória, da cultura, do civismo e da paz social.
O depoimento presente foi iniciado num dia em que senti o desejo de esquecer a rua tortuosa e saturada de automóveis em que habito, a rua dos passeios novos de dois palmos de largura, que tem um belo nome de poeta e de escritor: a Rua Vitorino Nemésio.
O relatório atento e cuidado sobre os oitenta metros de rua que estão de fronte de minha casa e se vêm da janela da minha cozinha daria para fazer um enorme levantamento de problemas de administração autárquica, infelizmente aplicável a um sem número de outras ruas, com as mil e uma variantes possíveis de disparate, desperdício e inconveniência.

A ESTRADA PARA VALE DE CANAS, O CHOUPAL, AS BENDITAS ZONAS VERDES...

A rua é, no seu traçado e na sua origem, muito antiga. Estou em Coimbra há somente trinta anos, o que não dá para contar coisa de jeito da sua história, que há-de vir de há muito mais tempo.
Há trinta anos iria enganar-se quem pensasse que seria brilhante o seu futuro promissor.
A colina semeou-se de casas bem em cima das ruas alcantiladas e tortuosas, metidas em cima de velhos carreiros ou cortadas na lomba dos cabeços, algumas com inclinações de meter medo, e ainda hoje sem tratamento adequado de águas fluviais, sem passeios seguros, sem prazer nem conforto para quem nelas vai de carro, sem calma nem segurança para quem nelas vai a pé.
Sobra, entre outros, o problema de não haver saneamento básico em muitas das suas áreas e de planificação urbanística atenta ou competente, nem vestígios dela.
O espaço privilegiado que é a Mata do Vale de Canas, tem vindo a sofrer do mesmo tipo de atitude negligente que vitimou o Choupal.
Que o digam os praticantes de BTT que sobem pela Rua Vitorino Nemésio até à Rua do Bombeiro Voluntário, onde se arrumam magníficas vivendas donde se desfruta a paisagem agora quase totalmente subtraída ao visitante casual.
Não há, para quem queira beneficiar desse tesouro, quer para Nascente quer para Poente, um único sítio onde se possa parar com sentimento de desafogo e prazer, circunstância agravada mais recentemente pelos tenebrosos incêndios que infligiram à antiga mata danos irreparáveis.
Tenho o hábito de ir a essa zona com visitantes de fora, sempre que sou procurado por forasteiros.
Gostaria de poder referir o conjunto de considerandos que me foram feitos por um arquitecto paisagista alemão e respectiva esposa, com os quais contemplei há algum tempo atrás, a magnífica paisagem até à Serra da Boa Viagem, num curto lapso de estrada, já na descida, onde o estacionamento é perigoso, o espaço exíguo e a paisagem, em todo o seu esplendor, parece estar desta forma entregue à insensibilidade negligente e ao desprezo mais absurdo.
Lá em cima do antigo miradouro de que nos era permitido ver as sumptuosas e surpreendentes serranias para o lado Nascente, uma cortina espessa de eucaliptos tinha entretanto crescido, cortando a visão pela totalidade, e frustrando a promessa que fizera aos visitantes.
Por todo o pequeno espaço ajardinado reinava um silêncio soturno, uma ausência de calor humano a que uma ou outra presença atípica poderia sugerir uma ocupação do espaço pela marginalidade, como é o caso no Choupal.
Faço aliás referência a uma visita ali efectuadas por mim, há anos, com um visitante de fora curioso de conhecer o mítico local, em plena luz do dia, durante o qual observei um clima completamente diverso daquele que era usual há cerca de 20 anos, quando ali praticava desporto com a minha família.
A presença intrusa da marginalidade mais suspeita estendia uma sombra de inquietação sobre o local, que desde então nunca mais incluí no meu percurso de visitas...
Como está mais actualmente, desconheço inteiramente.
Ou seja, nem a utilização dum património paisagístico que me parece do mais elementar bom senso preservar e desenvolver como riqueza colectiva e produtiva parece ter passado pela cabeça de quem governa a cidade.
A Mata do Vale de Canas nada tem ganho em segurança e aprazimento. Ao que me consta pelo saber de experiências feito de meu filho mais novo que para ali ia andar de bicicleta, são agora alguns atrevidos dos desportos ditos mecânicos que põem em risco os ciclistas e passeantes apeados.
De lugares povoados de utentes pacíficos, dum qualquer programa bem estruturado de utilização pública, de meios de transporte fáceis de acesso (com excepção para o bendito automóvel, para o qual é escasso o espaço de estacionamento) de facilidades e equipamentos aquecidos pela presença humana organizada, nem vestígios.
Falando de ciclistas, bem me custa vê-los passar à minha porta, vergados pelo esforço, a ter de respirar o gasóleo dos camiões e, pior do que isso, sujeitos a serem vitimados por um desses mastodontes, ou por outras máquinas mais miúdas, mas tripuladas por gente apressada e impaciente, ansiosa por desembrulhar o encadeado de curvas a toda a pressa, custe o que custar, pondo em risco a segurança própria e alheia.
O facto traz-me à lembrança a realidade de países muito ricos que poupam fortunas em combustíveis, poluição e concentração automóvel (países fabricantes de automóveis, note-se) infra estruturando vias de comunicação exclusivamente para ciclistas por tudo quanto é lado, nas cidades e fora delas, para fruição turística, melhoria do estado de saúde dos cidadãos ou pura e simples solução do problema dos transportes.
Entre nós, país importador de gasolinas e automóveis (e que fabrica bicicletas, note-se) esse tipo de preocupação não passa pela cabeça de quem manda (mal) e planifica (pior).
Quanto a bares, muito cá para baixo, inaugurou-se há tempos um, nas minhas vizinhanças, que nasceu paulatinamente de dentro do miolo de uma casa velha bem a cavalo da tal estrada estreita e convulsa.
E é ver as noites, com carros a esmo por cima de toda a folha e em estacionamento arriscado, proibido e incómodo.
Será que os presidentes e vereadores que aqui passam, de regresso às suas vivendas e montados nas suas viaturas oficiais nunca repararam nisso?
Acham muito bem?
Se sim é, daqui lhes remeto os meus parabéns.

A RUA VITORINO NEMÉSIO E AS SUAS METAMORFOSES

A tal estrada velha e antiga, feita agora rua "urbana" tortuosa e difícil, também utilizada às vezes pelas noites pelos praticantes dos desportos motorizados, não tem infra-estruturação que aguente a progressiva carga que sobre ela desaba, dia a dia. São camiões e camiões carregados de materiais de construção, e certamente milhões de toneladas de desaterros para cima e para baixo.
A estrada, nascida por por via dos acasos da sua antiguidade, foi-se moldando às encostas e ladeiras que a constrangem. Não fica por isso a dever nada a ninguém, não podendo por isso pensar-se que, se já não serve bem de há muito os milhares de veículos que por aqui passam, não terá com certeza futuro, porque não pode tê-lo.
Não há notícias contudo que lhe dêem esperança de melhores dias, ou ajudas concretas na planificação de alternativas.

UM PASSEIO, FRACO REFÚGIO PARA ASSUSTADOS CAMINHANTES

Alarmado para inércia de planificação para a segurança, tomei a iniciativa de sugerir para a rua onde habito a construção de um passeio, que minimamente salvaguardasse as condições de circulação pela mesma de passeantes apeados, dos que não passam montados em camião, desconfortavelmente apertados em autocarros ou nos milhares de automóveis que incessantemente por aqui circulam.
Lentamente foi avançando o processo de acumulação das assinaturas, lutando contra uma desconfiança e uma falta de convicção cívicas de bradar aos céus. Primeiro é lamentável que as pessoas tenham que recorrer a processos de solicitação pública e reivindicativa para disporem de algo que é elementar e deveria ter sido pensado e executado antes de tudo o mais por aqueles que têm o dever e ainda por cima são pagos pela comunidade para isso mesmo.
Depois, é necessário o bater de porta em porta que penosamente é levado a cabo por alguns vizinhos de boa vontade, arrostando com a fria incredulidade do vizinho pessimista, afeito à incompetente apatia e indiferença dos serviços e autoridades competentes.
Entregue o abaixo-assinado, devidamente fundamentado e apoiado com fotografias perfeitamente elucidativas, longuíssimo processo de espera tem lugar.
Sem que os residentes tenham qualquer espécie de conhecimento do facto decisório e de qual teria sido o efeito real da sua modesta solicitação, surge finalmente anunciada a construção do passeio em espaçosos e bem evidentes "outdoors", com tudo bem nomeado e descriminado. Assim fosse espaçosa e desafogada a obra!...
O passeio contudo desanima quem o vê e muito mais quem terá de andar nele pelo decénios que lá vêm.
Nuns sítios dá para ir de mão dada com a namorada ou com a mãe ou com o filho. Noutros só dá para marchar um cidadão sozinho.
Noutros locais terá de se ir ao pé-coxinho e noutros nem dum modo nem de outro. O passeio que por ali vai fraco, de repente, morre.
O poder das evidências dá força à fatalidade de nunca ninguém ter pensado que uma rua, quando nasce, é para todos.
E que num local onde a entidade responsável tem a coragem para licenciar a construção de milhares de casas de habitação, deve pensar primeiro como é que essas pessoas vão viver, e circular e estacionar e conviver e brincar e descansar dentro dumas normas que façam de tais habitantes não apenas pagadores de sisas, licenças, coimas, impostos, taxas (e votos!...) mas cidadãos no pleno uso dum justo e necessário sentimento de liberdade e prazer de existir.
Ou então assumir duma vez por todas aquela decisão que seria a mais lógica, por se ter deixado chegar a situação onde ela chegou: decretar em certas ruas o trânsito proibido aos peões!...
Já uma vez escrevi, há longos meses, aos SMASC, a comunicar algumas razões das que exponho acima. Não recebi qualquer resposta por escrito, forçosamente responsabilizante. Mas fui visitado por um simpático e jovem engenheiro, que cheio de gentileza tranquilizou as minhas preocupações. Quanto à realidade dos factos, permaneceram tal e qual, ou pior ainda.

O BETÃO INVASOR, A FALTA DE LIBERDADE E DE BEM ESTAR PARA TODOS OS CIDADÃOS!...

Nos termos de licenciamento da já referida urbanização onde habito existia um terreno vago, daqueles que são tomados aos proprietários do solo, para efeito de conveniência geral.
Este ere o aspeto do belo arboreto que existia nesse espaço, nessa altura verde, mas degradado e "apodrecendo" por negligência de quem de direito, "para os devidos efeitos"...:
O terreno vago acabou por ser oferecido a uma instituição de utilidade pública que ali instalou uma obra social cuja utilidade não se discute, mas cujas instalações foram arquitectadas de tal forma que efectuaram uma ocupação absolutamente esmagadora de todo o espaço disponível, indo em muitos detalhes certamente para além da legalidade urbanística, do bom senso estético e, sobretudo, para além da dignidade e comodidade do sítio em si, como lugar habitável com um mínimo de prazer e de espaço vital.
Anos que ali esteve aquele espaço vago, não serviu senão para utilização indiscriminada de senhores empreiteiros para despejarem detritos, porem e tirarem terra, lavarem camiões betoneira dos restos de cimento, etc.
É certo que os miúdos que aqui viveram durante os primeiros anos da nossa permanência no local ainda assim beneficiaram um pouco do vago sentimento de liberdade que aquela baldio selvagem lhes pode proporcionar como lugar de algumas brincadeiras.
Nunca tendo sido aproveitado, aliás, senão numa reduzida faixa da sua superfície (na maior parte completamente ocupado por silvas e outras espécies invasoras e até perigosas, por répteis e outros bichos).
Os donos e senhores da cidade não quiseram tornar este pedaço de terreno em nada que servisse a liberdade dos cidadãos, o convívio dos velhos e a necessidade premente das crianças, para ali instalar qualquer espécie de infra- estrutura que servisse a todos, e tivesse esse valor precioso que rareia: o do espaço útil em franqueza de liberdade, jardim, parque terreno de festas ou de jogos.
Nada. Não sobrou nada, nem para passeios, nem para áreas de estacionamento.
A fotografia a seguir mostra-nos a destruição do verde, com um "pequeno" detalhe que teria a sua importância se estivessemos num país onde as leis fossem para cumprir: azinheiras e sobreiros, árvores protegidas, entre outras, foram reduzidas a lenha...
A obra que virá a ser mostrada também numa fotografia a colocar futuramente, representa um esmagamento puro e simples de todo o espaço, em que a única parcela de passeio circundante se viu recortado ao mínimo, encostado a um paredão sem sentido e, ao que se diz infringindo a legalidade dos preceitos construtivos.
De resto, no espaço dito para ser livre (e verde...):
  • Nem um banco para um homem se sentar a ler um livro ao fim da tarde;
  • Nem lugar para um montão de miúdos ter o prazer de jogar a bola;
  • Nem espaço para abrir de silêncio o coração, para pensar ou conversar, para jogos populares, de crianças ou de adultos, como ainda se usa no centro das grandes cidades, vilas e aldeias de toda a Europa;
  • Uma criança que aqui nasça, que queira brincar algures terá que fugir daqui. E já agora, perguntará: para onde?
Europa de Paris tão longe onde em cada bairro há um sítio para os velhos jogarem às bolas, baterem as cartas e palrar da vida, como Deus manda.
Não acaba aqui, nem de perto, o rol das observações possíveis.
Muita coisa poderia dizer, e algumas bem documentadas e apoiadas pelo testemunho de condóminos e vizinhos.

A AVENIDA ELÍSIO DE MOURA, A CIRCULAR "EXTERNA" E ARRANHA-CÉUS À MANEIRA DO TERCEIRO MUNDO

Aqui bem perto alinham-se os torreões descomedidos da Avenida do Insigne Filantropo que foi Elísio de Moura.
Quem foi o urbanista que os plantou ali?
O mesmo que licenciou a colocação de hipermercados bem dentro da malha urbana da cidade? Os mesmos que andaram a prometer à cidade, em mandatos a fio, a construção duma célebre circular exterior, agora finalmente concretizada, mas coxa, por que acaba por desaguar em zonas saturadíssimas em ambas as suas extremidades.
Resultado: a circular é uma estrada comprida, sim senhor, mas é só isso, não preenchendo em absoluto os requisitos que o seu nome sugere, ou seja, de ser um anel eficaz para se circular à volta do aglomerado habitacional, fugindo às suas artérias saturadas, e retirando da malha urbana trânsito que lhe é alheio. Aliás não dá acesso directo nem ao IP3, nem à Auto-estrada de Lisboa Porto.
Não será um dos princípios fundamentais do urbanismo moderno não deixar que se enoendam no interior dos novos bairros habitacionais vias de penetração intensa de circulação automóvel, construindo tais zonas em áreas de velocidade reduzida obrigatória, sem saída para vias de circulação estruturante?
Não é preciso ir nem à Alemanha nem a Inglaterra para ver consagrado este princípio básico. Na nossa vizinha (e tão distante...) Espanha, até nalgumas das mais problemáticas áreas periféricas se vê observada essa regra da qual, em Coimbra, ninguém parece ter ouvido falar nos gabinetes de especialistas e técnicos da Câmara Municipal respectiva.
Regressando ao tema dos arranha céus da Avenida Elísio de Moura, há países na Europa em que este tipo de habitações é inconcebível, tendo-se tornado típico apenas das “megacidades” do terceiro mundo, Filipinas, Indonésia, Malásia e outros absurdos como a cidade do México, São Paulo no Brasil, etc.
Não cabe neste já longo rol de impressões a demonstração dos erros e das inconveniências duma tal "desorientação urbanística", óptimo negócio para os especuladores e péssimo negócio para quem ali comprou andares.
Cito apenas um caso histórico em Berlim de que tenho conhecimento (o "Märkischen Viertels" – 1965, Berlim Oeste) em que uma barbaridade urbanística de prédios de habitação de vinte andares ( muito diferentes dos da Avenida Elísio de Moura, mas dispondo de áreas envolventes de longe muito melhor dimensionadas) foi constituída como exemplo de crime urbanístico lesivo do bem estar e da saúde mental e física dos seus habitantes (o "Betonbrutalismus"), e determinou críticas tão fortes que impuseram uma autêntica repulsa por soluções do mesmo tipo em toda a Alemanha, a partir dessa data.
Mais de vinte anos depois, nem a serenidade dos arquitectos, nem o conselho de técnicos urbanísticos pagos por bons salários, nem o bom senso dos administradores autárquicos (que tanto viajam de avião para tantas paragens do mundo) nada aprenderam ou nada quiseram assimilar da experiência averbada por terceiros.
Rua Vitorino Nemésio, Outubro de 1999
(com algumas actualizações feitas no dia de hoje - 24/10/2006)
Costa Brites





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